segunda-feira, 27 de dezembro de 2010
sexta-feira, 24 de dezembro de 2010
sábado, 11 de dezembro de 2010
juízo final
“- Sente-se uma mulher especial?”
- Adoro que mo diga, confesso. Você ou qualquer pessoa que refira essas duas palavras, por essa ordem, numa frase. Não sei, é instinto de caridade, de sentimento. Não sou afectuosa mas sou emotiva. Muito. Ontem mencionaram que não sou de facto comum, mas sou normal. E talvez por isso me considerem uma mulher especial, porque consigo estabelecer pontes rápidas entre emoções, razão e palavras sintetizadas. Também me considero inteligente no campo abstracto, consigo resumir tudo a dois ou três traços mentais e orientar uma teoria inteira por aí, garantindo-me que não me perco porque os meus três pontos mentais interligados no abstracto me servirão de guia e não me deixarão fugir à minha tese central. Procuro ser coerente e já admiti que a idade ajuda nessas questões; nessas e em muitas que ainda não descobri. Porque realmente é só isso que me interessa, o agora. E isso serve-me para contra-argumentar até à morte o que acho que não está correcto. E eis a questão: (silêncio) descobri! Ainda não interiorizei que os anos têm muita coisa mais para me ensinar. E por isso ainda não deixei de ser egocêntrica ao ponto de desviar uma conversa inteira consigo para falar de mim. Porque é isso que eu sou, egocêntrica. Tudo isto associado às emoções claras e aos raciocínios rápidos no abstracto, é fácil que se converta num novo estado de alma que ainda não conhecia. Fantástico.
“- Desculpe? Não sei se a posso ajudar ou dizer-lhe que foi a conversa mais estranha que já tive com alguém.”
- Não preciso de ajuda, obrigada; preciso agradecer-lhe por com uma pergunta me ter feito desvendar algo que estava mal resolvido – estava assim como num purgatório. Também tenho a agradecer o facto de como culminar, referir que vou ficar na sua memória por ter sido a conversa mais estranha que teve. Já lhe disse que adoro sentir-me especial?
terça-feira, 7 de dezembro de 2010
Parecia-me tudo subtraído ao volume mais pequeno possível e concentrado nos teus olhos grandes e claros. Hoje aprendi que os olhos falam muito, mais do que a boca. Os olhos não sofrem o filtro da racionalização pelo qual passam as palavras. As palavras medem-se, os assuntos podem ser contornados ao ritmo do nosso interesse ou até das nossas emoções; mas os olhos estão nus. Estão sempre tão nus, que afirmei hoje a mim própria que é de facto impossível vesti-los e ainda bem; assim percebem-se coisas diferentes daquelas que as palavras nos dão a conhecer e está aí o segredo do mundo: percebamos que para perceber o que os olhos dos outros nos querem dizer, temos de saber transmitir coisas com os nossos. E quando te sentas à conversa com alguém que te olha nos olhos, sem medos, sem preocupações, só com dor e com angústias, entendes que devias parar de ter a mania que confrontas o olhar com quem quiseres porque és o maior, o melhor, o dono do mundo. Há quem te olhe de facto nos olhos. De facto entendes? Há quem se sente à tua frente e seja capaz de derrubar todos os preconceitos mesquinhos que tu e os que te rodeiam criaram acerca do que te envolve. Há quem tenha vivido na merda e consiga escrever três livros iguais ao que tu pensas que conseguirias escrever neste momento da tua vida e nem precisa de ser necessariamente mais velho do que tu. São outras perspectivas e hoje conheci uma petrificante. Desoladora. Que me deu vontade de chorar e confessar ao mundo inteiro que a partir de hoje vou ter uma posição diferente perante tudo. Perante os teus olhos, confesso também. Mudaste a minha vida e só te sentaste à conversa comigo num tom informal. E eu não tive nem medo, nem preconceito, nem ansiedade. E se agora descobrisse que estás aí dentro porque mataste a tua mãe, iria continuar a dizer a quem fosse que a prisão fez de ti um homem, diferente dos outros, especial. Porque os teus olhos disseram-me coisas que eu não sonhava que existissem. Porque senti tantas realidades duras nas tuas palavras mas desvaneci-as num instante quando li os teus olhos e eles me contaram que sentes as coisas como eu, que tens saudades e que te revoltas contra o sistema. O problema é que o teu sistema é de facto revoltante percebes? E o meu… é só inadequado ao meu tamanho egoísmo.